Mais de um milhão de mulheres participaram neste estudo dinamarquês. Com idades compreendidas entre os 15 e os 34 anos, estas mulheres foram acompanhadas desde janeiro de 2000 até dezembro de 2013. Os resultados são preocupantes.
De acordo com os dados, as mulheres que tomaram contracetivos orais combinados tiveram mais 23% de probabilidade de lhes ser receitado um antidepressivo, do que quem não usava. Para quem tomava pílula unicamente constituída por progestagénio, a probabilidade era maior – 34%.
Os dados pioram se estivermos a falar de mulheres em idade jovem – registaram 80% maior probabilidade de vir a tomar antidepressivos.
Noutros contracetivos hormonais – sistema transdérmico hormonal (adesivo), anel vaginal e sistema intrauterino hormonal – também se verificou um aumento desta probabilidade.
Pedimos ao Dr. Joaquim Neves, médico especialista em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, que comentasse os resultados deste estudo. Para ele, estes são “dados observacionais que realçam mais uma vez a necessidade de enquadrar a orientação da contraceção na prescrição e no acompanhamento”.
Quando uma mulher pretende iniciar a toma de um contracetivo, qualquer que ele seja, deve, em primeiro lugar, consultar sempre um médico. Na consulta, esse médico tem a responsabilidade de analisar clinicamente o caso e perceber se existe algum fator de risco relacionado com a toma de um contracetivo. Nomeadamente, fatores como a existência de trombose na história familiar de primeiro grau da mulher, de tabagismo, de excesso de peso/obesidade e de doenças que possam aumentar o risco de tromboembolismo.
A par disso, o médico deve dar a conhecer à mulher que métodos existem e as principais consequências do seu uso.
Falamos de consequências, mas a verdade é que a eficácia deste tipo de contracetivos é muito elevada: têm 99% de probabilidade de serem eficazes, quando tomados/aplicados corretamente. É importante sublinhar, como diz Joaquim Neves, que “os efeitos benéficos da contraceção hormonal oral são superiores aos potenciais efeitos adversos que podem originar”.
Segundo dados da Sociedade Portuguesa da Contraceção e da Sociedade Portuguesa de Ginecologia, em 2015, cerca de 58% das mulheres portuguesas preferia a pílula como método contracetivo. Esses dados talvez se devam à tradição e à influência de experiências anteriores, aponta o especialista.
Mesmo assim, diz também que hoje já há um cuidado na prática clínica de tentar dar a conhecer outras alternativas de contraceção. Em 10 anos, houve um decréscimo do uso da pilula e, em contrapartida, um aumento da utilização do dispositivo intrauterino (DIU), do implante, do adesivo e do anel vaginal.
Ainda acerca do estudo, o médico especialista levanta duas questões: “trata-se de um estudo na Dinamarca e até que ponto é que podemos retirar conclusões diretas em relação ao outras regiões geográficas? Será que no estudo foram considerados de forma detalhada a existência de outros fatores que podem influenciar o humor?”
A propósito deste estudo, Channa Jayasena, uma especialista em endocrinologia de uma universidade britânica avisou: “o estudo não prova (e nem tem essa pretensão) que a pílula desempenha qualquer papel no desenvolvimento da depressão. No entanto, sabemos que as hormonas tem um papel muito importante na regulação do comportamento humano.”
Em Portugal, a depressão atinge pelo menos 8% da população por ano. É o país da Europa com a taxa mais elevada e, no mundo, é apenas ultrapassado pelos EUA.
Não deve deixar de tomar a pílula ou qualquer outro contracetivo hormonal só porque tomou conhecimento deste estudo. Deve sim, caso esteja preocupada, consultar o seu médico de família e tentar perceber se, no seu caso em particular, a pílula poderá ter realmente alguma consequência deste género.