Quando em julho de 2007 Ana Paula Matos foi detida por colegas da PJ, abriu-se, dentro da Judiciária, uma chocante caixa de Pandora. Ana Paula Matos era uma preponderante coordenadora na então DCITE (Direção Central de Investigação do Tráfico de Estupefacientes) e os colegas do combate à corrupção que escrutinaram a suspeita que sobre ela recaía chegaram com relativa facilidade à confirmação do crime que cometera. Desesperada com avultadas dívidas pessoais que contraíra, a à época inspetora-coordenadora apropriou-se de €94 mil que tinham sido apreendidos ao longo de quatro buscas em investigações de tráfico de droga, entre 2005 e 2006. Foi colocada em prisão preventiva e, em 2009, condenada a sete anos e meio de cadeia. Mas a sombra da suspeita instalou-se, desde então, sobre a DCITE, hoje UNCTE (Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Estupefacientes), a ponto de ser alvo de duas sindicâncias. Até consumar-se esta terça-feira, 5, a detenção do coordenador Carlos Dias Santos, na reforma há cerca de quatro anos, do inspetor-chefe no ativo Ricardo Macedo, e de mais 13 pessoas.
Desta vez, os colegas da Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC), numa operação que designaram de Aquiles, terão reunido indícios suficientemente fortes de que Dias Santos e Ricardo Macedo, elementos influentes na UNCTE, alegadamente receberam subornos de milhares de euros e outro tipo de vantagens patrimoniais para bloquear investigações, fechar os olhos a casos suspeitos de tráfico de droga e até passarem informações a quem os remunerava. Esta terça-feira, a operação Aquiles, integrada num inquérito a cargo do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), mobilizou quase duas centenas e meia de inspetores da PJ, além de juízes de instrução e procuradores da República, tendo sido realizadas cerca de 120 buscas em Lisboa e no Porto.
‘DORES DE AMIZADE’
A investigação da UNCC sobre a UNCTE irá continuar, dado o volume de documentação recolhido nas buscas efetuadas. Foi o que aconteceu, aliás, após a detenção da ex-coordenadora Ana Paula Matos. O então diretor da PJ, Alípio Ribeiro, pediu ao ministro da Justiça, à época Alberto Costa, que a tutela fizesse uma sindicância à DCITE. As averiguações terminaram sem consequências. Dois anos depois, em 2009, o Ministério Público seria inundado por denúncias, até de venda de cocaína apreendida, as quais colocaram 35 inspetores da DCITE sob suspeita, de alto a baixo. Outra vez sem consequências. Mas soube-se que o coordenador Dias Santos fora alvo de uma denúncia interna, remetida ao diretor nacional da PJ, Almeida Rodrigues. No entanto, chegaria incólume à reforma, em 2011, após 34 anos de serviço na Judiciária.
Na operação Aquiles estão em causa suspeitas de corrupção ativa e passiva para ato ilícito, associação criminosa, tráfico de droga e branqueamento de capitais. Os 15 detidos, com idades entre os 39 e os 61 anos, serão agora submetidos a primeiro interrogatório judicial, para aplicação de medidas de coação. Esta é a informação fria, que contrasta com as emoções de uma fonte que esteve ligada à investigação e que a VISÃO contactou: “Há aqui dores de amizade, incredulidade pela gravidade…”, balbuciou.