Até hoje, a ideia de reverter o processo de envelhecimento só tinha cabimento em guiões de ficção científica. Mas David Sinclair, 46 anos, investigador e professor de Genética em Harvard, tornou-a credível nas páginas das principais publicações científicas. Falta pouco, assegura, para existir um comprimido capaz de nos fazer viver mais algumas décadas, com qualidade de vida. As suas descobertas levaram a revista TIME a incluí-lo, em 2014, na lista das 100 pessoas mais influentes do mundo. No centro das suas pesquisas está o resveratrol – um polifenol, com propriedades antioxidantes, presente nas uvas. Começou por aumentar até 70% a longevidade de leveduras e vermes, interferindo na atuação de proteínas (sirtuínas). Avançou depois para estudos em humanos, comprovando benefícios na redução do colesterol, por exemplo. Depois de analisar milhares de combinações, está perto de chegar à fórmula “mágica”, capaz de travar o envelhecimento.
Numa tarde quente de junho, encontrámos Sinclair no seleto Clube de Harvard, em Nova Iorque, para uma conversa sobre a sua mais recente criação: conseguiu incluir num creme facial, de uso diário, a fórmula de um lifting.
Estuda o resveratrol há 12 anos. O que há de tão especial nesta molécula?
As suas potencialidades não param de me surpreender. Comecei por descobrir que ativa uma enzima muito especial no corpo, a SIRT1, que nos protege das chamadas doenças do envelhecimento e que controla a velocidade a que envelhecemos. Mas o resveratrol não atua apenas como antioxidante. É muito mais interessante e poderoso do que isso: estimula as defesas do nosso corpo contra várias doenças.
Tomar resveratrol isoladamente não chega ainda para nos fazer viver mais e melhor? Toma-o como suplemento diário?
Os estudos em humanos indicam várias melhorias na saúde, ao nível do metabolismo e da pressão arterial, por exemplo, mas ainda não é clara a dosagem que será melhor. Eu tomo 1000 mg por dia. Surgiram muitos suplementos no mercado, por isso aconselho que procurem resveratrol puro, por questões de segurança
Pode haver algum efeito secundário?
Em 12 anos de estudos, não vimos nenhum efeito negativo, só positivos. Nós comemos plantas e frutos com moléculas de resveratrol há milhões de anos. O nosso organismo conhece-as e sabe como fazer uso delas.
Testou milhares de moléculas até chegar a esta “eleita” no combate ao envelhecimento. O futuro passa pela aposta de outras combinações com o resveratrol?
Definitivamente. Estamos agora a trabalhar em moléculas mil vezes mais eficazes a fazer a estimulação das SIRT1 do que o resveratrol isolado. E no caso particular da junção com o ácido hialurónico para cosmética, os resultados suplantam a soma dos seus benefícios isolados. Foi verificada uma melhoria de 226% na preservação da estrutura e firmeza da pele.
Como concilia a investigação nas áreas da estética e da saúde? A investigação do seu ‘elixir da juventude’ não tem prioridade?
A minha investigação tem várias aplicações na cosmética e não fazia sentido ficarem no fundo de uma gaveta. Hoje, metade do meu tempo é dedicado à investigação com a Caudalie [empresa de cosmética francesa], e a outra metade ao medicamento. Mas serão precisos pelo menos mais 10 anos, e investimentos na ordem dos mil milhões de euros, para fazer chegar um comprimido ao público. E, repare, eu já gastei 10 anos e mil milhões de euros nesta investigação… São processos morosos, mas estamos a chegar lá. Estamos já na fase de ensaios clínicos em humanos.
E é um comprimido que as pessoas tomarão de forma preventiva ou funcionará quando já existir a doença?
É muito eficaz sobretudo como prevenção, pois inibe ou adia o processo de desenvolvimento das doenças associadas ao envelhecimento. A premissa é de que venha a ser possível viver mais 30 a 50 anos, e com qualidade, sem doenças associadas. No produto desenvolvido com a Caudalie, o princípio é o mesmo. Quanto mais cedo se começar a usar, melhor vai ser o aspeto da pessoa daqui a 10 ou 15 anos. Há uma mudança significativa, porque estimulamos as defesas da pele, mas não há um fenómeno ‘Benjamin Button’ [filme em que o personagem nasce velho e vai ficando mais novo]. Ou seja, uma mulher de 40 anos que comece a aplicar o creme não vai ficar com o ar jovial dos seus 20 anos. Mas se o usar regularmente, chegará aos 50 sem que a sua pele tenha envelhecido.
Como surgiu esta parceria com a Caudalie? Deve-se ao facto de a empresa ter a patente do resveratrol?
Estávamos a trabalhar em separado e não fazia sentido. A Caudalie descobriu esta molécula nas suas vinhas [há 20 anos, em Bordéus, na quinta da família, que produz o Château Smith Haut Lafitte, um dos mais premiados vinhos do mundo] e nós, em Harvard, descobrimos a sua ação estudando como os genes são afetados no envelhecimento. Decidimos juntar esforços em 2013 para descobrir novas aplicações e combinações para o resveratrol e torná-lo ainda melhor. Dos mais de 20 mil genes que estudei, houve um, o HAS2, que saltou à vista. Ficou claro que a associação de oligómeros de resveratrol com ácido hialurónico aumenta significativamente a expressão deste gene, com implicações nos fibroblastos dérmicos.
O ácido hialurónico já é usado na cosmética. O que é diferente nesta combinação?
A grande revelação é que com a junção destas micromoléculas o organismo é estimulado a produzir naturalmente o seu próprio ácido hialurónico [contrariando o processo de formação de rugas e de perda de firmeza] e mimetizando o processo das injeções de preenchimentos ou botox.
Daí o nome da gama, resveratrol Lift. Os liftings têm os dias contados?
Ainda não, mas caminhamos para lá. Este tipo de produtos precisam de algum tempo de utilização, não dão resultados imediatos.
O facto de estimular naturalmente a regeneração da pele, numa época em que o “natural” e livre de químicos, é uma tendência mundial, é importante?
Sem dúvida. Temos muitos projetos e visam reprogramar de forma natural o organismo para abrandar o processo de envelhecimento. O mais ambicioso vai mesmo reverter o envelhecimento… [pausa] Sobre isto não podia falar, pois não? [diz, entre risos, olhando para os proprietários da Caudalie, sentados numa mesa próxima. Bertrand Thomas comenta que essa revolução “ainda vai levar anos a chegar ao mercado…”] Mas posso dizer que os resultados preliminares são muito bons? [Riem-se todos.] Ai está: acabei de dar-lhe um exclusivo mundial.