O 37º Congresso do PSD, que terminou no domingo passado, serviu para aclamar Rui Rio como o novo presidente do partido mas não só. Foi útil para entender que os congressistas e militantes não gostaram da escolha de Elina Fraga para a vice-presidência. Foi este conclave que permitiu que o polémico Salvador Malheiro chegasse à Comissão Permanente dos sociais-democratas, ocupando também uma das seis vice-presidências. Durante os três dias da reunião magna, as listas apresentadas pelo ex-autarca do Porto aos órgãos nacionais do partido deixaram muitas distritais frustradas, um sentimento que pode vir a ter repercussões no Grupo Parlamentar. O congresso foi ainda o palco ideal para Luís Montenegro ter dado o primeiro passo para ser candidato nas próximas diretas. Apesar dos sinais de união que tentaram dar-se não foi possível esconder o incómodo que existe em relação aos bons resultados do Governo e da geringonça. Eis os cinco problemas que o presidente do PSD tem para resolver:
ELINA FRAGA
“Nem os outros vice-presidentes sabiam que Elina Fraga ia ser escolhida para a vice-presidência”, comentou com a VISÃO uma fonte social-democrata que não quis ser identificada. A surpresa foi geral e poucos seriam os que tinham conhecimento da escolha de Rui Rio. O espanto era justificado. A ex-bastonária da Ordem dos Advogados distinguiu-se entre os sociais-democratas pelos “piores motivos.” Enquanto exercia o seu mandato, foi uma forte crítica de Pedro Passos Coelho e do executivo que chefiava. Organizou uma manifestação às portas do Parlamento para contestar a reforma do mapa judiciário proposta pela então ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz; apresentou uma queixa-crime contra todos os membros do governo por aceitarem levar avante a reforma; chegou a falar do “colapso do sistema judicial”; e admitiu estar arrependida de ter votado no PSD nas legislativas de 2011. Não foi por isso de estranhar que, no último dia do congresso, quando Elina Fraga foi chamada ao palco, se tenham ouvido apupos e assobios.
Além das questões políticas há outras razões que deixam os militantes laranja com um pé atrás. Depois de terminar o seu único mandato na Ordem dos Advogados, em 2016, o seu sucessor no cargo, Guilherme Figueiredo, ordenou uma auditoria às contas de Elina Fraga. As conclusões foram conhecidas em novembro passado e não trouxeram bons indícios. “Falta de controlo orçamental” e “suspeita de favorecimento na contratação de serviços” foram algumas das irregularidades identificadas. O relatório foi enviado para o Ministério Público e o DIAP de Lisboa está atualmente a investigar o caso.
SALVADOR MALHEIRO
O Presidente da Câmara de Ovar e presidente da distrital de Aveiro foi o diretor de campanha de Rui Rio nas eleições diretas. Ao contrário de Elina Fraga, era expectável que o novo presidente do PSD puxasse o autarca para o seu núcleo duro. No entanto, as polémicas que tem protagonizado nos últimos tempos fazem de Salvador Malheiro uma figura que gera algum desconforto em alguns setores sociais-democratas. O primeiro caso em que se viu envolvido foi avançado pelo jornal Expresso, que noticiou que havia vários “militantes fantasma”, que não existiam, no concelho de Ovar. Mais tarde, no dia das eleições diretas, foi o Observador que revelou que uma carrinha subsidiada pela autarquia fazia parte de um esquema em que vários militantes eram levados até à urna para depositarem o seu voto em Rui Rio.
A imagem de Malheiro rapidamente ficou manchada. E menos límpida ficou quando se soube que estava a ser investigado por ter, alegadamente, adjudicado à empresa do líder da concelhia do PSD de Ovar obras no valor de 2,2 milhões de euros. Apesar das polémicas, não foi vaiado no Congresso. Até pelo contrário, foi dos vice-presidentes mais aplaudidos pelos congressistas. Assim como no caso de Elina Fraga, foram vários os analistas que vieram a terreiro lembrar o “banho de ética” que Rui Rio prometeu introduzir na política durante a sua campanha interna.
GRUPO PARLAMENTAR
Este será um problema que Rui Rio terá de resolver à distância. O novo líder do PSD não é deputado e tem de coordenar os esforços com o presidente do Grupo Parlamentar para afinar a estratégia. À partida este não seria um problema por si só, não fosse o facto de o afastamento de Hugo Soares no cargo não ter caído bem na bancada social-democrata. O ainda líder parlamentar não renunciou ao cargo e manteve duas conversas com Rui Rio onde lhe terá sido transmitida a ideia de que o novo presidente do partido não contava com ele para o cargo. Hugo Soares pôs o cargo à disposição e marcou eleições para a próxima quinta-feira. Fernando Negrão é o único candidato e, ao que tudo indica, será o homem que se segue no cargo. Mas não é o nome mais consensual.
As votações podem ser penalizadoras para Fernando Negrão, não apenas por não ser unânime mas também, e sobretudo, depois de as listas que Rui Rio apresentou para os órgãos nacionais do partido terem deixado de fora várias distritais que o apoiaram e que foram fundamentais para a sua eleição. Os congressistas não gostaram da atitude e manifestaram-no no congresso quando votaram na Comissão Política Nacional: 35% dos votos foram nulos ou brancos. Só Menezes tinha tido um resultado pior que o de Rio. A mágoa ainda existe e pode estender-se à bancada. Entre os deputados há o receio de que esta indignação em forma de voto – ou veto – volte a surgir na votação para a liderança da bancada parlamentar. Não contar com os deputados do seu lado pode ser um mau presságio para Rui Rio.
LUÍS MONTENEGRO
O ex-líder parlamentar do PSD foi um dos vencedores do congresso social-democrata. “Depois da intervenção do [Luís] Montenegro, podemos fechar o congresso” ironizou um militante social-democrata no sábado. Num discurso que durou cerca de 25 minutos, o deputado criticou aqueles que o acusaram de falta de coragem e foi duro para Rui Rio. Revelou que ia deixar o lugar de deputado e avisou que se um dia quiser avançar para a liderança do partido não vai “pedir licença a ninguém.”
Fora do Parlamento, Montenegro vai beneficiar da liberdade de não estar comprometido com posições do partido quer seja no Parlamento quer seja noutros locais. Avisou que vai continuar a combater “e a defender o PSD” nas “rádios, nas televisões e, porventura, nos jornais.” Uma forma de avisar que estará atento à vida política e à do partido. Garantiu que não será “oposição interna” de Rui Rio mas será um peão que o novo líder não vai controlar. No ar ficou ainda a ideia de que a pré-candidatura estava lançada. O ex-autarca do Porto terá, certamente, marcação cerrada.
SONDAGENS
Ao longo do 37º Congresso do PSD foram várias as intervenções em que o Governo e a geringonça foram visados. Havia a clara noção de que para as eleições legislativas o partido corre contra o tempo. Faltam menos de dois anos para que se escolha um novo Parlamento e a vantagem do PS nas mais recentes sondagens ronda os dez pontos percentuais. Uma margem confortável para os socialistas, que, em alguns dos resultados, alcançam a maioria absoluta com eventuais coligações à esquerda. O PS vai apostar as fichas na maioria absoluta ao passo que o PSD tem pouco tempo e muito terreno para galgar. Este será certamente um dos maiores desafios de Rio e a sua prova de fogo. O relógio está a contar.