Os artigos do jornal oficial comunista têm as cautelas habituais para os lados da Soeiro Pereira Gomes. Mas os sinais dados na edição de hoje são mais claros do que nunca: o PCP estará a poucas horas de anunciar o seu apoio, condicionado, a um Governo do PS, suportado pelos comunistas e pelo Bloco na Assembleia da República.
Já ontem à noite, António Costa saíra sorridente da sede nacional do PCP após mais de três horas de reunião com a direção comunista, mas o editorial do Avante! desta quinta-feira destaca o facto de haver condições para a entrada em funções de um Executivo do PS “para a adoção de uma política que assegure uma solução duradoura. Nenhuma razão política e institucional pode ser invocada para questionar essa solução governativa”, escreve-se no órgão oficial do PCP.
Para o Avante!, não há dúvidas de que o novo quadro parlamentar saído das últimas eleições “permitirá concretizar um conjunto de medidas e soluções que deem resposta aos interesses dos trabalhadores e do povo”. Entre a utopia e a realidade, os comunistas assumem, nas páginas do jornal, o desafio de enfrentar o pragmatismo do momento. O novo quadro parlamentar “permitirá ir tão longe quanto for a disposição de cada força política que a compõe para suportar o caminho da reposição de salários e rendimentos, da devolução de direitos, do reforço do acesso à saúde, à educação e à segurança social, do apoio às pequenas e médias empresas, aos reformados e aos jovens”.
“Novas soluções” à vista
Num outro artigo, João Dias Coelho, da Comissão Política comunista, explica que o PCP “age e atua no plano imediato no quadro das condições concretas”. Ou seja, “sem abdicar das suas posições de princípio e do seu caminho de luta por uma política patriótica e de esquerda, da democracia avançada e do socialismo”, os comunistas estarão disponíveis para “abrir caminho a um futuro de progresso e justiça social”.
Nesse sentido, o PCP desencadeou já uma campanha nacional de esclarecimento e mobilização que em muito ultrapassa as fronteiras do partido. Num documento preparado para o efeito, os comunistas assumem existir na AR “base suficiente para a possibilidade de novas soluções de governo”, acentuando que as conversas com o PS servem “para assegurar as respostas e soluções que deem expressão à aspiração dos trabalhadores e do povo”.
O que verdadeiramente incomoda o PCP é, segundo outro artigo publicado nesta edição do Avante! a campanha desencadeada contra a integração do partido numa solução à esquerda, à boleia de uma “teia de interrogações armadilhadas, de suposições pé-de-galo, de ameaças mascaradas de advertência, de previsões catastróficas e de juízos de intenção sem pudor ou reserva” que servirão para “turvar as águas, borrifar a realidade com molha-tolos e épater le bourgeois”. Segundo o autor, Henrique Custódio, a direita tem-se entretido a escrutinar ao milímetro “suposições mirabolantes sobre as negociações em curso entre PS, PCP e BE, que ninguém conhece ou tem de conhecer”. Para a semana, conclui-se em jeito de promessa, já haverá veredicto na Assembleia da República “devidamente lavrado” e serão “separadas as águas entre os que querem encetar o caminho de uma política alternativa” e “os que querem mais do mesmo”. Legendas para quê?