“Sinto um grande desgosto por todos os portugueses envolvidos nesta matéria não terem puxado para o lado que nós puxamos.” O lamento de Edgar Ferreira, administrador da Holding Violas Ferreira (HVF), à VISÃO, reflete a dor de um homem derrotado. Depois de ter resistido e bloqueado a aprovação da desblindagem dos estatutos do banco, acabou por atirar a toalha ao chão: à terceira assembleia geral, caiu o limite dos direitos de voto que imperava nos acionistas do banco liderado por Artur Santos Silva e Fernando Ulrich, entregando o controlo maioritária ao espanhol CaixaBank, que agora tem mesmo de prosseguir com a Oferta Pública de Aquisição (OPA) em curso.
“As pressões dos controladores europeus era a de que tínhamos de ir por esta solução ou o banco seria altamente penalizado. Por isso, ou os estatutos ficavam desblindados ou o BCE atuava imediatamente quanto à exposição do BPI aos grandes riscos de Angola. E nós não queríamos prejudicar o banco, mas lutar contra quem o queria fazer”, reforça Edgar Ferreira. Daí que tivesse desistido das providências cautelares que estavam a impedir a votação da proposta de desblindagem, agora aprovada em assembleia geral.
“A vida muda…”
“A vida muda…”, respondeu Artur Santos Silva, visivelmente vencido, quando interrogado sobre a razão de abdicar agora da gestão do BFA, solução para diminuir a exposição aos grandes riscos de Angola, a que sempre resistiu e até contestou. A proposta foi enviada à angolana Unitel (que tem também Isabel dos Santos como acionista) e propõe a venda de dois por cento do BFA a troco de €28 milhões. Proposta esta que terá na sua base já um acordo prévio de aceitação. E que transferirá o controlo acionista do banco angolano de Portugal para o país de José Eduardo dos Santos.
“O BPI não tinha alternativa que não fosse desconsolidar no banco angolano. Por isso, tinha de reduzir a participação e alterar o acordo acionista, pois BCE entende que não pode haver co-gestão no BFA”, justificou o presidente do Conselho de Administração. O BPI ficou assim encurralado pelo BCE e teve de entregar o poder a Angola no BFA, e entregar o poder a Espanha, em Portugal.
Ironicamente, das muitas propostas oficiais e oficiosas que estiveram em cima da mesa para resolver o problema em Angola, nenhuma se assemelhava tão desvantajosa para o banco português, nomeadamente aquela em que Isabel dos Santos oferecia 140 milhões por 10% do BFA. Agora, resolveu a coisa com 2% e €28 milhões, e os 48,1% que continuarão no BPI serão uma mera participação financeira que receberá, ou não dividendos. A avaliar pelos termos do acordo, o BFA não mandou para Portugal €66 milhões de dividendos relativos a 2014 e 2015, mesmo sendo controlado pelo BPI. Terá agora de o fazer até 9 de Dezembro, assim como depositar 30 milhões de dólares.
“Infelizmente, os capitais portugueses não conseguem suportar neste momento uma instituição bancária. Há muito tempo que esse sonho, inclusive de mim próprio, se tornou praticamente impossível”, observou, a propósito da perda dos centros de decisão portugueses nas instituições financeiras.
Fernando Ulrich acrescentaria, bastante consternado: “Este processo todo foi muito complexo… Pela minha parte, este é um grande dia por termos chegado até aqui… Vamos deixar o passado. O que interessa agora é olhar para a frente, para o futuro”.
OPA tem de avançar
O futuro é o CaixaBank. Podendo agora exercer os direitos de voto equivalentes aos 45% do capital do BPI tem forçosamente que avançar com uma OPA (quando ultrapassou os 33% foi isento da operação porque não podia votar com mais de 20%). E já avançou com um comunicado onde se diz disposto a “assumir o controlo do BPI”, enfrentando “com garantias os futuros desafios do setor financeiro português e as exigências regulatórias”.
Os pequenos acionistas terão agora de decidir se querem vender as suas ações, – provavelmente com prejuízo, ainda que a CMVM possa obrigar o banco catalão a subir o preço – ou ficar numa instituição que terá uma grande diminuição de liquidez em bolsa. Para o sucesso da OPA, basta ao banco conseguir mais 7% do capital.
“Isto é tudo uma vergonha”, comentou à VISÃO um grupo de pequenos acionistas que conversavam na rua no final da assembleia. “Andaram todos a fazer acordos” e “há por aí muita coisa escondida”. Alguns relatos do decorrer da assembleia remetem para situações caricatas, como uma reunião improvisada da administração do BPI em pé e sussurrada com os acionistas á espera e sem perceber o que estava a acontecer. Outros esperam que a CMVM estude bem os acordos feitos e até o empréstimo de €400 milhões que o CaixaBank fez ao Estado angolano, e que Santos Silva, quando questionado, disse ser apenas “uma linha de crédito feita às empresas de apoio à exportação”.
Edgar Ferreira nega que tenha havido qualquer acordo para desistir da sua posição e admitiu à VISÃO que “muito provavelmente” vai vender a sua posição na OPA. “Estamos, por um lado, a lidar com um grande banco espanhol e, por outro com uma coisa que não se sabe exatamente o que é”, diz.
Permanece a incógnita relativamente á posição de Isabel dos Santos, que controla cerca de 20%. Agora que tem o controlo do BFA vai querer continuar a ser a segunda maior acionista do BPI nas mãos do CaixaBank? Não é ainda claro. A sua posição tem sido de abstenção, como voltou a fazer nesta ultima assembleia geral.