Foi uma estreia em cheio. Histórica por não poder ter sido mais desastrosa. Os mercados bolsistas mundiais entraram com o pé esquerdo no Ano Novo. E, arrastados pela China, deram um grande trambolhão com todos os índices mundiais acompanhados a pisarem território vermelho.
A primeira sessão de 2016 nas Bolsas de Shanghai e Shenzen sofreram um abalo fortíssimo com uma quebra de 7% que obrigou encerrar a negociação a meio.
O dia 4 de janeiro poderá entrar para a história do capitalismo moderno. Por um lado, as perdas de 7% foram as maiores até agora sofridas pelo índice mais importante da China, o China Security Index 300 (CSI), que lista as 300 principais cotadas chinesas. E podem representar apenas o início do esvaziamento de uma bolha especulativa que levou o governo de Pequim a intervir no mercado em meados de 2015. Por outro tratou-se do primeiro dia em que se teve de recorrer ao chamado circuit-breaker. Criado na sequência do crash chinês deste verão, trata-se de mecanismo de segurança que interrompe a negociação quando as perdas se tornam demasiado grandes. Ninguém adivinhava que o “travão” tivesse de ser acionado, logo no na primeira sessão da sua vigência.
O circuit-breaker tem duas fases. A primeira é acionada quando as perdas da sessão atingem os 5 por cento. Aí, a negociação é interrompida durante 15 minutos e novamente retomada. A segunda fase é quando as perdas atingem 7% e aí encerra-se a sessão bolsista.
Em teoria, a primeira fase deveria introduzir um acalmia no mercado. Em teoria. Esta segunda-feira pode ser vista como uma prova de que nem sempre a teoria se traduz na prática.
Depois da interrupção de um quarto de hora, a negociação continuou em baixa. Muitos investidores individuais (responsáveis por 80% do volume de transações em Shanghai e Shenzen) escaldados com a primeira quebra, começaram a vender ao desbarato, para não ficarem “agarrados” caso se passasse à fase seguinte.
E essa ocorreu exatamente sete minutos depois de reiniciada a sessão, que iria nos 90 mil milhões de dólares transacionados (83 milhões de euros, aproximadamente).
Os vários gatilhos e…
Segundo os analistas citados na imprensa internacional, o fator que desencadeou esta onda de pânico na China terão sido as estatísticas, divulgadas este fim de semana, relativas à produção industrial, a apontar para uma queda pelo décimo mês consecutivo e a perspetiva de um abrandamento da economia para níveis da década de 90 do século passado. Como gatilho adicional, ocorreu uma desvalorização da moeda chinesa, o yuan, face ao dólar para níveis mais baixos dos últimos quatro anos. Muitos analistas atribuem parte das “culpas” ao fim iminente da proibição de seis meses de venda de ativos pelos investidores institucionais, decretada na sequência do crash do verão.
A evolução do mercado de ações chinês nos últimos dois anos aponta para razões mais profundas: a eforia bolsista que grassa pela China há um ano e meio que tem levado muitos investidores individuais que descobriram a Bolsa como uma maneira de fazer ganhos rápidos e que entre o verão de 2014 e o de 2015 levaram as cotações a valorizações de até 150 por cento. Grande parte da valorização de vários títulos sustentou-se assim na especulação pura e dura, provocando uma bolha que começou a esvaziar-se. O mercado chinês está com uma crise suscetível de se agravar e que não se soluciona apenas com intervenções do governo no mercado, como aconteceu no verão.
… as asas da borboleta
A quebra do CSI 300 e dados pouco animadores sobre a economia chinesa afetou praças como Wall Street e Tóquio. O Nikkei 225, índice japonês mais importante, fechou o dia bolsista com uma quebra superior aos 4% ao passo que às 18 horas desta segunda feira, os norte-americanos Dow Jones e Nasdaq desvalorizavam, respetivamente, 3,62% e 2,80.
Os mercados, asiáticos fecharam todos no vermelho com o índice de Hong Kong, Hang Seng, negativo em 3,83 por cento. Os latino-americanos para lá caminhavam a essa hora. E também se registaram fortes perdas na Europa, com o índice de referência Stoxx600, a desce 2,8% e o DAX alemão a liderar as perdas com 4,56 por cento. Lisboa não escapou ao abalo chinês com perdas de 1,54% no PSI 20, o menos penalizado na Europa.
O crash chinês desta segunda-feira e o seu impacto nos quatro cantos do mundo trazem à memória aquela metáfora, tida como uma das premissas da Teoria do Caos, de que “o bater das assas de uma borboleta em Pequim pode causar um tufão no outro lado do mundo”. As próximas semanas mostrarão se será realmente assim ou se os fenómenos dinâmicos libertados pela situação chinesa não terão antes o efeito de um tsunami global provocado pela queda de um dragão gigantesco em pleno Mar da China.